País reúne condições únicas para liderar a economia de baixo carbono, mas especialistas apontam que estabilidade regulatória e modelos financeiros serão decisivos para transformar potencial em competitividade
O Brasil vive um momento estratégico raro, impulsionado pela combinação entre abundância de recursos naturais, pressão global por energia limpa e necessidade de modernização industrial. Segundo estudo do Itaú Unibanco em parceria com a FGV, a transição energética pode adicionar até R$ 465 bilhões ao Produto Interno Bruto (PIB) até 2035, criando um novo ciclo de crescimento baseado em tecnologias de baixo carbono.
De acordo com Philipe Kilzer, diretor de operações estruturadas do Grupo Bolt, o principal desafio não está apenas na geração de energia renovável, mas na criação de um ambiente que traga previsibilidade ao investimento. Para ele, conectar infraestrutura, capital e indústria será determinante para transformar energia limpa em vantagem competitiva.
“O Brasil não precisa apenas produzir mais energia renovável. Precisa conectar infraestrutura, capital e indústria com modelos que deem estabilidade de longo prazo. Autoprodução greenfield, contratos estruturados de longo prazo e financiamento privado serão os pilares dos próximos anos”, afirma.
O estudo aponta que cada real investido em energia renovável pode gerar até R$ 1,57 em retorno econômico, fortalecendo cadeias produtivas e redesenhando a geografia industrial brasileira, sobretudo no Nordeste, onde o potencial eólico e solar já começa a criar novos polos produtivos.
Apesar do potencial, especialistas apontam três gargalos que ainda limitam a velocidade dos investimentos. O primeiro é o risco regulatório, acentuado por episódios de curtailment, que afetam diretamente a previsibilidade de receitas dos projetos e ampliam a percepção de risco dos financiadores.
Outro ponto sensível é o modelo de autoprodução via projetos greenfield. Mesmo após o veto presidencial que retirou a obrigação de exclusividade desse formato, o mercado continua enxergando nesses projetos maior segurança jurídica e rastreabilidade, o que mantém o greenfield como principal caminho para viabilizar grandes empreendimentos.
Nesse contexto, estruturas mais sofisticadas, que integram engenharia, capital privado e modelagem financeira, ganham protagonismo. O papel dessas plataformas é criar ambientes capazes de conectar produtor, investidor e consumidor industrial, reduzindo incertezas e ampliando a escala da transição energética.
O tema ganha ainda mais relevância com a agenda internacional da COP30, que reforça o debate sobre competitividade climática e reposicionamento econômico dos países. No mercado brasileiro, contratos de longo prazo, projetos híbridos e autoprodução deixaram de ser soluções alternativas e passaram a orientar estratégias corporativas de energia.
Para Kilzer, a discussão vai além da pauta ambiental. Energia limpa passa a ser um ativo econômico capaz de reduzir riscos, atrair capital e elevar a produtividade industrial. Segundo ele, o Brasil reúne as condições para deixar de ser apenas fornecedor de commodities e assumir um papel de liderança na economia de baixo carbono.

