O malandro, na dureza, senta à mesa do café,

Toma um gole de cachaça, acha graça e dá no pé!

(Ópera do Malandro – Chico Buarque)

Leitoras e leitores! Vamos falar de estelionato!

Nos anos 90 conheci um conhecido comerciante de linhas telefônicas no centro de São Paulo (sim geração YXZ, linhas telefônicas eram vendidas a peso de ouro antes da privatização da Telesp) – esse camarada (na verdade um estelionatário), costumava me dizer entre chopes bem bebidos na Praça Dom José Gaspar, que “brasileiro é papeleiro” – adora comprar um papel: sejam ações de empresas inexistentes, título de clube que ainda será construído, imóvel na planta, bilhete premiado, etc. A alma tupiniquim exposta sem pudor pelo trambiqueiro: compramos qualquer coisa que nos seja bem embalada e oferecida!

Ano de 2023 – a lenda dos papeleiros revisitada com os pastores dos octilhões – diversificando sua carteira de investimentos (empreender no Brasil é necessidade), atuavam em evangelização, produção de mídia fake, e um fundo de investimento inexistente, que lesou mais de 50 mil pessoas – quem se especializa em mentir, mentirá cada vez melhor. O meu perdão antecipado às igrejas e missionários sérios e comprometidos com sua missão! O que pasma é que pessoas conseguem acreditar numa história completamente absurda, que prometia octilhões, número indizível e incalculável. Tudo bem embalado e oferecido, em nome do Senhor. Afinal, era golpe!

Também assistimos recentemente os defensores dos primeiros réus do 8 de janeiro desfilar despreparo e desespero na difícil tarefa de argumentação junto a um STF municiado com toda sorte de provas e muito sangue nos olhos – o que mais me surpreendeu, como bacharel em direito que sou, foi a posterior choraminga e narrativas bizarras dos advogados em suas próprias redes sociais (como se fossem extensão do tribunal), gerando uma visibilidade midiática à custa dos indefesos clientes condenados, repisando teses de julgamento político, manifestação pacífica (o esfaqueamento do Di Cavalcante que o diga), conspirações etc. Cadê a ética dessa turma? Estariam errados os juízes ao aplicar a lei? Será que essa defesa afinal, foi um golpe midiático? Para quem?

Capturo duas colegas de trabalho conversando sobre as próprias dívidas, geradas por compras feitas por impulso, e pasmem, apostas em sites eletrônicos! Uma delas comenta – “eles me enganaram, dizendo que eu ia ganhar dinheiro… preciso parar de apostar…” – pessoas simples, com muita falta de informação e senso, e muita vontade de ter fama e dinheiro – vítimas ideais do “clica aqui” – o papel fake dos anos 90 viralizou no formato digital e a mídia vende sem puder soluções de emagrecimento, emprego dos sonhos, viagens com desconto de 80%, negócios mágicos e… apostas. O jogo está proibido no Brasil, mas estes cassinos literalmente tomam dinheiro das pessoas, mas… o governo trabalha a narrativa de “taxar” os sites de aposta (vejam bem, taxar e não fiscalizar ou coibir). Será afinal um golpe?

E tem mais: na esteira das muitas horas de boa prosa do Cid com delegados da PF, vem (ainda em segundo o plano de visibilidade) a informação que o nosso ex-mandatário teria se reunido durante o seu governo com a cúpula militar para avaliar a possibilidade de um golpe de estado. Parece que as quatro linhas da constituição não eram o bastante como campo de jogo. Na delação cabe tudo, que ainda se fará provar verdadeiro ou não, mas não estranha pelo conjunto da obra de meias verdades e muitas mentiras, que procuravam embalar e vender à sociedade que desconhece o que seja democracia, uma cruzada messiânica contra um comunismo que morreu pelos anos 80.

Mas… podemos fazer nossa parte! Vamos nos ligar mais, questionar mais, duvidar mais, pesquisar mais, dialogar mais, ouvir mais, orientar, acolher, indignar, aumentando nosso repertório para não acreditar mais em duendes, sejam de esquerda ou direita, eletrônicos ou convencionais, de cima ou de baixo, de Deus ou do Diabo. Afinal, como dizia uma velha tia, o que nada feito pato, voa como pato, anda como pato, e grasna, deve ser pato! E afinal, era golpe!?

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