Com tecnologia BECCS, país pode remover CO₂ da atmosfera e gerar até US$ 3,8 bilhões por ano em créditos de carbono
O Brasil, segundo maior produtor de biocombustíveis do mundo, está diante de uma oportunidade estratégica de transformar a indústria do etanol em uma potência de descarbonização e rentabilidade. A tecnologia de captura e armazenamento de carbono com bioenergia, conhecida como BECCS (Bioenergy with Carbon Capture and Storage), desponta como caminho viável para aliar sustentabilidade e geração de receitas com créditos de carbono.
Tecnologia carbono negativo e potencial brasileiro
Em 2023, o país produziu mais de 43 bilhões de litros de etanol e biodiesel, sendo 35,4 bilhões apenas de etanol – um recorde, segundo o Ministério de Minas e Energia. Com esse volume, o Brasil pode capturar parte das emissões de CO₂ do processo produtivo e armazená-las, reduzindo efetivamente o impacto ambiental e retirando gás carbônico da atmosfera.
“O Brasil possui um dos maiores potenciais para BECCS do mundo, dada a sua tradição no mercado de etanol e a capacidade ainda pouco explorada para produção de biogás”, afirma Isabela Morbach, advogada e cofundadora da CCS Brasil, entidade que promove o avanço dessa tecnologia no país.
Lucros com créditos de carbono e liderança paulista
Um estudo da CCS Brasil estima que o país pode capturar cerca de 200 milhões de toneladas de CO₂ por ano, sendo 40 milhões aplicáveis ao BECCS. Isso pode render entre US$ 2,7 bilhões e US$ 3,8 bilhões anuais, dependendo da cotação do crédito de carbono. As regiões Sudeste e Centro-Oeste concentram 87% do potencial de bioenergia do Brasil, com destaque para o estado de São Paulo, que responde por mais de 15 milhões de toneladas de CO₂ passíveis de captura – 60% delas vindas de usinas de etanol.
A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) aponta que o Brasil tem 24% de bioenergia em sua matriz energética, ante 9% na média mundial. O etanol a partir da cana-de-açúcar e do milho apresenta alto potencial para BECCS devido à pureza do CO₂ gerado – que pode chegar a 98%.
Custo reduzido e pioneirismo nacional
A remoção de CO₂ via BECCS custa entre US$ 20 e US$ 400 por tonelada – valor muito inferior ao de outras tecnologias como a DACCS (captura direta do ar), que pode custar até US$ 1.000 por tonelada. A Agência Internacional de Energia (IEA) projeta que o BECCS poderá capturar até 190 milhões de toneladas de CO₂ por ano até 2030.
Um dos projetos pioneiros é da empresa FS, que está implantando uma planta de etanol com BECCS em Lucas do Rio Verde (MT). A meta é evitar a emissão de 423 mil toneladas de CO₂ por ano e, futuramente, alcançar 1,8 milhão de toneladas capturadas anualmente, tornando-se a primeira do tipo fora dos Estados Unidos.
“A indústria de biocombustíveis é a que tem maior potencial de lucrar com CCS no país, com estrutura já existente, energia limpa e créditos de remoção valorizados”, destaca Isabela.
Regulação e investimento são essenciais
Apesar do cenário promissor, especialistas alertam que o avanço da tecnologia depende da definição de marcos regulatórios e da consolidação do mercado de carbono no país.
“É preciso que haja um estímulo por parte das agências reguladoras para a solidificação da regulação da captura e armazenamento de carbono. Com isso, novos projetos poderão ser estimulados”, conclui Isabela Morbach.