Modelo criado para startups em crescimento acelerado já não acompanha a realidade de empresas autossustentáveis e altamente automatizadas
Embora o SAFE (Simple Agreement for Future Equity) tenha sido amplamente adotado como ferramenta de investimento em startups nas fases iniciais, esse modelo pode estar se tornando obsoleto frente ao novo perfil das empresas de tecnologia. A análise é de Matheus Martins, sócio do Barcelos Martins Advogados e especialista em startups, inovação e fundraising. Segundo ele, o uso indiscriminado do SAFE no Brasil ignora mudanças estruturais no ecossistema empreendedor e pode deixar investidores sem garantias mínimas de retorno.
O novo cenário das startups
O SAFE foi criado em 2013 pela aceleradora Y Combinator com o objetivo de facilitar investimentos pré-seed e seed, evitando burocracias e discussões iniciais sobre valuation. Até 2022, cerca de 70% das rodadas seed nos Estados Unidos utilizavam esse instrumento, conforme dados da plataforma Carta. No entanto, o surgimento de startups altamente automatizadas e com geração de receita desde os primeiros meses vem desafiando a lógica que sustentava o modelo.
“Essas empresas conseguem crescer de forma lucrativa, com poucos funcionários e sem a necessidade de rodadas sucessivas de captação. Isso torna o SAFE arriscado, já que ele depende da realização de uma rodada futura para converter o investimento em participação societária”, explica Martins.
O caso da Toptal como alerta
Um exemplo emblemático dessa mudança é o da Toptal, startup que nunca realizou uma nova rodada de investimentos após o estágio inicial. Um dos investidores, Denis Grosz, recorreu à Justiça americana para tentar converter seu SAFE, mas perdeu a ação. A decisão judicial, noticiada pela CNBC em janeiro de 2025, reconheceu que, sem nova captação, não havia obrigação contratual de conversão.
“Esse é um alerta grave: muitos investidores ainda operam com uma lógica ultrapassada, usando contratos pensados para outra geração de empresas”, ressalta o advogado.
Mútuo conversível como alternativa mais segura
Diante desse novo contexto, Martins recomenda a adoção do mútuo conversível como instrumento mais adequado. “Ele oferece prazos de vencimento definidos, cláusulas de reembolso e a possibilidade de conversão por decisão do investidor, mesmo sem nova rodada”, destaca. Além disso, o modelo conta com respaldo jurídico no Brasil por meio do Marco Legal das Startups, o que amplia a segurança nas operações.
“Insistir no SAFE pode levar o investidor a acompanhar o crescimento da startup de longe, sem nunca participar dele. É fundamental adaptar os instrumentos jurídicos à nova realidade do mercado”, conclui Martins.

