Aumento quase 70% no preço do fio importado acende alerta em polos industriais e ameaça a continuidade de linhas de produtos
A indústria têxtil brasileira enfrenta um dos cenários mais críticos dos últimos anos com a escalada no preço da poliamida 6 (PA6), matéria-prima indispensável para artigos esportivos, moda praia, lingerie e meias. Como o Brasil não produz o fio, qualquer oscilação internacional impacta diretamente o setor — e a alta recente, de US$ 3 para US$ 4,97 por quilo, já compromete desde custos industriais até capacidade de abastecimento.
Em Santa Catarina, o maior polo de confecção do país, a preocupação é imediata. Segundo dados da FIESC, o estado sustenta 178,7 mil empregos no segmento, que agora enfrenta risco de descontinuidade de linhas inteiras. Para Renato José Benvenuti, vice-presidente da RVB Malhas, o novo patamar inviabiliza a operação. “O valor aplicado compromete a produção de volumes competitivos. Na prática, não será possível manter as linhas de produtos à base de poliamida em nosso portfólio”, afirma. Ele alerta ainda para a perda de mercado para produtos importados, especialmente da Ásia.
A pressão ganhou força após a adoção de uma sobretaxa provisória sobre o fio importado. Para as empresas, porém, o problema central é estrutural: a dependência total de um insumo externo e a falta de alternativas nacionais. Além disso, líderes do setor criticam o uso de valores de referência da poliamida 6.6 — insumo mais caro e de aplicações distintas — como parâmetro para precificação, considerada tecnicamente inadequada.
No Nordeste, a inquietação é semelhante. A DelRio, no Ceará, teme impactos no abastecimento. “Elevar custos de um insumo sem equivalente nacional representa um grande risco para nossa produção”, afirma Daniel Pereira de Souza, vice-presidente da companhia.
Outros polos também relatam prejuízo direto. Em Joinville (SC), a Diklatex já registra queda no volume produzido. “Tivemos um impacto importante no volume de produção que usa fios exclusivos da Huading, principal fornecedora do mercado nacional”, explica Mauro de Oliveira Ferraz, gerente de Supply Chain, que vê risco também no desenvolvimento de novos produtos.
Os efeitos extrapolam o nível empresarial. Segundo a Abit, o setor soma 25,3 mil empresas, gera 1,3 milhão de empregos diretos e movimenta R$ 32,9 bilhões anuais em salários. Com a poliamida 6 encarecida e sem substituto local, milhares de postos podem ser afetados.
Para o economista Mohamed Amal (FURB), o momento exige cautela regulatória. “Punir uma das principais fornecedoras de um insumo sem substituto local é arriscado. O resultado pode ser o oposto do esperado: menos competitividade, mais custos e perda de empregos”, avalia.
O CEO da LIVE!, Gabriel Sens, reforça o impacto sistêmico: “Qualquer decisão deve preservar a continuidade das operações, o emprego e a competitividade de um dos setores que mais geram renda e oportunidades. É o futuro da indústria nacional que está em jogo”, afirma.

