Manutenção da taxa básica de juros eleva o custo do crédito, reduz competitividade e ameaça novos investimentos. Entidades e especialistas defendem alinhamento entre política monetária e crescimento econômico

A decisão do Banco Central de manter a taxa Selic em 15% ao ano gerou forte reação de setores produtivos e de analistas do mercado. Enquanto o Comitê de Política Monetária (Copom) justificou a medida pela persistência da inflação de serviços, representantes da construção civil, da indústria e do setor financeiro alertam que o ciclo prolongado de juros altos pode comprometer o ritmo da economia real.

De acordo com Renato Correia, presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), o impacto sobre o setor imobiliário é imediato. “A construção é um dos setores mais sensíveis ao custo do crédito e à confiança do consumidor. Uma Selic de 15% por um ciclo longo traz desafios, porque o setor depende de financiamento de longo prazo, e esse custo torna muitos projetos inviáveis”, afirma.

A CBIC revisou, no final de outubro, de 2,3% para 1,3% a projeção de crescimento da construção em 2025, refletindo a pressão do crédito caro e o desaquecimento dos lançamentos. “Manter os juros nesse nível por muito tempo é apostar numa desaceleração prolongada da economia real”, completa Correia.

O mesmo diagnóstico é feito pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG), que vê risco de perda de competitividade e retração da produção. “Com a Selic elevada por mais tempo, as empresas terão mais dificuldade para financiar capital de giro e investir em novos projetos. Isso enfraquece a capacidade produtiva e adia a retomada do crescimento”, avalia o presidente da entidade, Flávio Roscoe.

Segundo a FIEMG, os efeitos da política monetária se espalham por toda a cadeia produtiva, afetando setores dependentes de crédito ao consumo, como o automotivo, o eletroeletrônico e a própria construção civil. “Quando o consumo encolhe, a indústria sente o efeito em cadeia, postergando planos de expansão”, reforça Roscoe, que também alerta para a deterioração do parque fabril e o adiamento de investimentos em modernização.

Para além da economia doméstica, os reflexos também chegam ao câmbio. A economista Raissa Florence, sócia-diretora da Oz Câmbio, explica que a manutenção da Selic em patamar elevado mantém o real valorizado, mas encarece o crédito externo. “Essa postura amplia o custo do financiamento em moeda estrangeira, especialmente para empresas com passivos em dólar. Ao mesmo tempo, o diferencial de juros em relação aos Estados Unidos, que já iniciou seu ciclo de cortes, aumenta a volatilidade e exige gestão cambial mais estratégica”, analisa.

Raissa aponta ainda que o discurso do Copom será determinante para o comportamento futuro das taxas. “Se o Banco Central sinalizar cortes em 2026, mesmo que graduais, o mercado pode antecipar um alívio nas curvas de juros e no dólar futuro. Caso contrário, o cenário de cautela se mantém, com pressão sobre o crédito e os investimentos produtivos”, conclui.

Com juros altos, baixo crescimento e um ambiente de incerteza fiscal, empresários e analistas defendem que o país precisa buscar um ponto de equilíbrio entre controle inflacionário e estímulo à atividade econômica — condição essencial para preservar a competitividade e destravar investimentos no setor produtivo.

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