*Por Giulio Franchi e Maria Beatriz Torquato
Hoje em dia é comum vermos crianças e adolescentes utilizando de forma assídua os meios digitais para as mais diversas finalidades, englobando do estudo ao lazer. Esse cenário foi intensificado com o advento da pandemia do Covid-19, em virtude do distanciamento social adotado para combatê-la.
A referida situação que fez com que as crianças e adolescentes tivessem que se adaptar a uma nova realidade: as aulas no formato online. O grupo dessa faixa etária que antes estava acostumado com as interações de forma presencial tanto na escola quanto fora dela se viu imerso no ambiente virtual para socializar, estudar e pesquisar. Isso ocorreu das mais variadas formas, através de “jogos, brinquedos conectados, uso de aplicativos e programas, comunicação por mensagem, áudio e vídeo, aulas online, interface com inteligência artificial em chatbots, afora as já conhecidas redes sociais, entre outros”[i].
Com isso, diante do maior volume de informações de crianças e adolescentes sendo tratado no ambiente digital, aumentou-se a preocupação acerca da proteção de dados desse grupo e do risco de eventuais vazamentos. Isso porque tem-se a combinação de um grupo mais vulnerável com um ambiente em que as informações são eternizadas de maneira muito fácil e rápida.
O que no mundo físico se restringe a um diálogo em que o limite são as paredes dos cômodos, no mundo virtual essa barreira é quebrada e a exposição alcança proporções enormes, podendo repercutir de forma direta no futuro das crianças e adolescentes, o que reforça, portanto, a relevância do tema.
Dessa forma, ressalte-se que a importância dada a proteção de dados pessoais de crianças e adolescentes é tão grande que há uma seção da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), a III, dentro do capítulo referente ao tratamento de dados pessoais, destinada somente a esse público.
Dentro desse contexto, cabe destacar que a lei acima mencionada dispõe que o tratamento de dados pessoais das crianças e adolescentes deve ser realizado no melhor interesse da criança e do adolescente (Art. 14, caput, LGPD), bem como que o tratamento de dados das crianças deve ser realizado com o consentimento específico e em destaque dado por pelo menos um dos pais ou responsável (Art. 14, § 1º, LGPD). Acrescente-se a isso que o recém aprovado Enunciado 684, da IX Jornada de Direito Civil, esclarece que o referido artigo não exclui a aplicação das demais bases legais, se cabíveis, observando o melhor interesse da criança, não sendo, portanto, o consentimento a única base aplicável.
O melhor interesse deve ser observado com muita atenção e respeito, indicando que “o resguardo das informações relevantes dos menores deve ser sempre em prol do seu desenvolvimento e em atenção aos seus direitos fundamentais. Destaca-se aqui, principalmente, o direito à privacidade, entendido como a possibilidade – atual e futura – de ter o controle das próprias informações”[ii].
Um dos pontos que merece atenção é o da superexposição muitas vezes feita pelos próprios pais nas redes sociais, de maneira que a preocupação com o tratamento dos dados não se restringe apenas aos dados que os menores fornecem para as variadas situações na internet, mas também a como os próprios pais e familiares os expõem nas redes.
Assim sendo, diante da magnitude da relevância da temática, mostra-se fundamental ter cautela com o tratamento de dados pessoais das crianças e adolescentes, bem como investir em ações educacionais preventivas voltadas ao público infantojuvenil e seus responsáveis para alertá-los sobre a importância do tema e dos perigos das possíveis consequências.
Considerando a premissa de que uma vez na internet – na maior parte dos casos – sempre na internet, fica o alerta de cuidado para o que vocês, leitores, compartilham de menores na internet; sobre o que os menores ao redor de vocês têm compartilhado nas redes, e é claro, com quem vocês andam compartilhando essas informações.
[i] LATERÇA, Priscilla Silva; FERNANDES, Elora; TEFFÉ, Chiara Spadaccini de; BRANCO, Sérgio (Coords.). Privacidade e Proteção de Dados de Crianças e Adolescentes. Rio de Janeiro: Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro; Obliq, 2021, p. 257. E-book. Disponível em: <https://itsrio.org/wp-content/uploads/2021/10/Privacidade-e-Protecao-de-Dados-de-Crian%C3%A7as-e-Adolescentes-ITS.pdf> Acesso em: 04 ago. 2022.
[ii] Ibidem, pág. 277.
Advogado. Pós-graduado em Direito Empresarial pela FGV São Paulo. Alumni do Data Privacy. Associado ao International Association of Privacy Professionals (IAPP). Membro da Comissão do Novo Advogado do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP).