A popularização da inteligência artificial trouxe agilidade às pequenas e médias empresas, mas especialistas alertam que o uso sem curadoria pode comprometer identidade, consistência e credibilidade das marcas
O avanço das ferramentas de inteligência artificial tem atraído cada vez mais pequenas e médias empresas, que veem na tecnologia uma forma de otimizar comunicação, marketing e atendimento ao cliente. Com soluções gratuitas e intuitivas, muitos negócios passaram a incorporar a IA no dia a dia, buscando reduzir custos e ganhar velocidade. Porém, o uso indiscriminado vem revelando um efeito colateral preocupante: a perda de personalidade e autenticidade das marcas.
Pesquisas recentes indicam que cerca de 40% das PMEs já utilizam alguma aplicação de IA. No Brasil, três em cada quatro micro e pequenas empresas acreditam que a tecnologia pode impulsionar seus negócios. Mas boa parte delas não investe em capacitação ou revisão humana, o que afeta a qualidade do conteúdo produzido — e, em alguns casos, coloca a reputação em risco.
A promessa de produzir mais gastando menos é tentadora, mas o uso sem estratégia pode gerar resultados contrários ao esperado. Textos genéricos, imagens com falhas e uma comunicação padronizada demais tornam-se frequentes quando a IA é usada de forma automática e sem direção. Em um cenário em que autenticidade se tornou um ativo imprescindível, esse é um risco que pode custar caro.
Para Murilo Weber, cofundador da Spot.ia, o problema não está na tecnologia em si, mas na forma como ela é aplicada. “Muitas PMEs ainda enxergam a IA como um atalho, quando, na verdade, ela exige direção e sensibilidade. Sem propósito e contexto, a ferramenta apenas replica padrões. É comum vermos empresas trocando identidade por velocidade e, no fim, o que era para ser inovação acaba se tornando ruído. A inteligência artificial pode ser extremamente estratégica, mas isso só acontece quando existe curadoria, alguém capaz de interpretar o que faz sentido ou não dentro de uma narrativa de marca”, analisa.
A percepção também aparece entre empreendedores que, na prática, testaram os limites da automatização. Muitos relatam perda de conexão com o público após excesso de dependência da IA — um sinal de que o problema não é técnico, mas estratégico.
É o caso de Júlia Pabis, sócia da Straccia, restaurante especializado em sanduíches italianos. “No começo, a IA parecia resolver tudo: texto, imagem, legenda, até atendimento. Investimos cerca de R$ 500 por mês em planos de assinatura e automação, acreditando que isso deixaria nossa comunicação mais eficiente. Mas quanto mais automatizávamos, mais genérica ela ficava. Percebemos que o público não se conectava com aquilo”, relata. “Foi um aprendizado importante: a tecnologia ajuda, mas quem dá sentido e emoção à mensagem ainda somos nós.”
Com investimentos em IA que já ultrapassam R$ 13 bilhões no Brasil, especialistas reforçam que a tecnologia precisa ser usada com estratégia, propósito e curadoria humana. Mais do que tendência, o uso responsável da IA se tornou peça-chave para qualquer plano de crescimento sustentável.

