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Já é um hábito pessoal, quando realizo entrevistas de seleção, perguntar pelos pais e avós do candidato, o que fazem, de onde vieram, como se encontraram… a jornada da família nos dá pistas interessantes do contexto e valores aos quais o potencial colaborador foi exposto; não considero isso uma ciência exata, mas ajuda muito compreender a persona por trás da pessoa entrevistada.
A família, a igreja, o convívio no bairro ou comunidade, a escola, são territórios de aprendizado de valores, signos e comportamentos, condicionamentos iniciados na mais tenra idade, que desenharão o mindset de nossa infância; nossa identidade social é (re)desenhada adolescência, quando o contato com outros contextos (moda, esporte, música, ideologias, literatura, cinema, drogas, sexo, etc.), aguça nossa curiosidade e senso crítico. É o momento onde a gente tem a primeira oportunidade para compreender, questionar ou afirmar valores e paradigmas herdados.
E mesmo quando conseguimos trabalhar uma identidade nova do adulto em formação, enriquecida pelo trabalho, compromissos mais sólidos de convívio grupal – amizades, casamento, voluntariado – guardamos inconscientemente nosso legado, impresso na memória, no caráter, aflorando nas manifestações de alegria, tristeza, medo e raiva. Temos por hábito nas nossas apresentações musicais tocar jingles de comerciais antigos, e sempre nos surpreendemos como todos lembram e cantam os chicletes midiáticos que há 40 anos vendiam balas e cobertores… fica grudado no DNA da pessoa! E claro, ao ouvir a melodia, sentir o perfume, ver a foto que remete ao tempo passado, imediatamente se estabelece a distensão e entrada em uma zona de conforto, algo que nem sempre explicamos, mas gera segurança e identificação – é a repetição do padrão.
Paradigmas e valores são como os jingles antigos – estarão sempre lá, impressos em algum chip neural; mas padrões são externalidades recebidas (e reproduzidas) e não representam exatamente o que nós somos – nos iludimos com mitos e verdades que podem ser a origem de grandes conquistas e alegrias mas também do sofrimento que muitas vezes causamos a nós mesmos e as pessoas que nos cercam – o cordão umbilical cortado por nós, torna nossa alma menos cativa da moral recebida e nosso espírito mais aberto a comungar com outras verdades permite rupturas conscientes onde reafirmamos nossas crenças “possibilitadoras” que eu incorporamos em nossas vidas e largamos no caminho as crenças limitantes, que nos causam paralisia ou sofrimento…
Pai, eu já tô crescidinho
Pague pra ver, que eu aposto
Vou escolher meu sapato
E andar do jeito que eu gosto
(Sapato 36 – Raul Seixas)
Assim como no plano pessoal, não vamos gerar desenvolvimento e evolução da sociedade reproduzindo padrões – precisamos da ambiguidade, da diversidade social, das diferentes perspectivas que permitem entender os vários lados de um desafio, e construindo soluções coletivas de alta qualidade. A reprodução de padrão nos mantém na zona de conforto, a papaguear frases feitas e respostas rápidas somente reconhecidas por nossos pares, a olhar pela mesma luneta o mesmo cenário cristalizado no tempo.
Formigas, cupins e outras centenas de espécies se comunicam por padrões que asseguram a perpetuidade e reprodução dos coletivos – chamamos de sistemas vivos inteligentes, porque mesmo sem cognição conseguem ser reativos e adaptativos para sobreviver e evoluir. Nós, seres supostamente pensantes podemos escolher nossos caminhos de adaptabilidade, avaliando, rompendo ou modificando o padrão, fruto de necessidade, amadurecimento, desejo, ou simplesmente sobrevivendo a um evento externo drástico. Quanto mais maleáveis, mais aptos a viver num mundo de disrupções permanentes.
O indivíduo parcialmente desenvolvido, meramente portador de uma função social especializada, deve ser substituído pelo indivíduo plenamente desenvolvido, adaptável a várias atividades, pronto para aceitar qualquer mudança de produção; o indivíduo para quem as diferentes funções sociais que desempenham são apenas formas variadas de livre manifestação dos seus próprios poderes, naturais e adquiridos…
Esse texto atualíssimo do século XIX já nos chamava a atenção para o que viria – modelar serem humanos como ferramentas a serviço de padrões sociais, laborais, religiosos, é construir pessoas potencialmente infelizes e incompletas. Quando não exercemos nosso livre arbítrio, podemos nos colocar a serviço de modelos recortados, reproduzir preconceitos e comportamento irracionais (ex. “odeio corintiano”, “mulher é tudo igual”, “todo patrão é f***) – o que não corresponde ao padrão, enxergo como ameaça, e reajo protegendo meu quintal de crenças.
A publicidade, as religiões, a classe política, compreendem e estudam perfis e personas, procurando adeptos que se identifiquem com determinado conjunto de crenças, nos induzindo a comprar produtos e narrativas, nos transformando em militantes, fanáticos e consumeristas inconscientes, enganados em nossas próprias zonas de conforto. É como tomar remédio para curar a ansiedade, sem querer resolver através do autoconhecimento, nossos reais problemas e angústias.
Podemos seguir a manada? Claro, se isso fizer sentido e for uma escolha consciente, livre. Quando a gente leva a sério somente os argumentos que sustentam nossas crenças podemos cair no auto-engano (“prefiro não discutir, prefiro não saber”) – a vida fica mais fácil, mas nós ficamos mais vulneráveis e despreparados – ficar dentro dessa bolha é perder parte do encanto da vida e da convivência social. Nossos programas de crenças subconscientes podem criar desafios que nos afastam de quem realmente somos, de nossas potências e todas as possibilidades que podemos criar e experimentar.
E quem gostou do texto do século XIX?? É de um incomodado economista alemão que enxergou o ser humano para além do determinismo que história lhe reservava.
Penso, logo transgrido – alguém vai me julgar por isso??
Empreendedor social, consultor empresarial, educador e músico, pai da Mariana e cidadão de Atibaia. Possui mais de 40 anos de trajetória profissional transitada entre o meio corporativo e o terceiro setor. Atualmente é dirigente da ONG Mater Dei de Atibaia-SP e violonista do grupo Sentido do Samba.
Gostei do texto.
Informações que levam a refletir sobre diversas situações em que acabamos seguindo a manada simplesmente por desconhecer ou pelo fato de querer pertencer.
Sua colocação referente a querer tomar o remédio mas, não curar o problema quando aborda a necessidade de se autoconhecer mostra o que a maioria seja por medo ou desconhecimento vivem se enganando e tentando arrumar um culpado para seus problemas.
Parabéns Gian pelo texto!