Reflexões sobre o nepotismo

Quem na vida já não escutou o dito popular – “se um dia você encontrar um jabuti no alto de uma árvore, não mexe e não questione, pois se jabuti não sobe em árvore, alguém colocou lá…”

O jabuti na árvore é o exemplo vivo que no Brasil somos muito eficientes na manutenção da incompetência. Os quelônios não voam, não escalam, são pesados e lentos, defendem-se com suas carapaças onde rapidamente se escondem ao primeiro sinal de perigo. Fazem uma certa presença, com ar de nobreza robusta e capacidade longeva de até dois séculos. Haja aposentadoria!

Conheci na vida muitos jabutis, em empresas, instituições e sobretudo na política. Machos e fêmeas, de cascos polidos e movimentos cuidadosos de quem sabe que o tombo é grande e o chão longínquo, visto do alto onde foram colocados. O pouco movimento não chama a atenção e garante salvaguarda de predadores, mas seguem a sina serem alimentados artificialmente por longo tempo.

O jabuti na árvore não produz, não ensina, nem aprende – só se alimenta do sistema. Não subiu por mérito ou qualificação, e sim por troca conveniente de favores, a depender dos graus de comprometimento ou talentos ocultos. Neste ecossistema de co-dependências, podemos ter jabutis atendentes, secretárias, porteiros, auxiliar administrativos, estagiárias, assessores de toda espécie, diretores e consultores especiais.

Raramente veremos jabutis em atividades fim e áreas estratégicas – marketing e vendas, articulação política, trabalho técnico especializado, criação e tecnologia, caça-talentos, onde profissionais vivem de resultados e da solução de problemas, são ambientes hostis às tartarugas de baixa qualificação e poucas habilidades.

Mas temos ainda casos raros dos jabutis que foram promovidos de galho – seja por tempo de casa ou pura compaixão, pesando na estrutura das árvores, ou mesmo jabutis que se elegem a altos cargos públicos (muitos apenas uma vez), onde deixam indeléveis marcas de sua passagem inconveniente pelos galhos onde pousaram sem legitimidade.

O nepotismo endêmico do Brasil já derrubou bons projetos empresariais e muitos projetos políticos – parentes, amigos e amantes nem sempre são parceiros e colaboradores confiáveis quando temos crises pela frente – jabutis são bajuladores e raramente dão bons conselhos. Mas defendem seus espaços de poder com a garra ferrenha dos emergentes…

Meu pai contava uma história bem mineira, de dois caboclos carpindo um milharal – em dado momento, passou um elefante voando – os dois se olharam à distância e nada disseram; dali a pouco mais um elefante voando e mais uma troca de olhares sem palavras. Se achegaram em silêncio, pitando um tabaco, e vem um terceiro elefante voando um rasante sobre os dois. Um rompe o silêncio, respira, encara o outro e diz: ói cumpadi, acho que o ninho é por aqui...

Na mais pura cultura popular – se encontrar um jabuti na árvore, não pasme, nem se espante – deixa estar no seu caminho de quietude e mediocridade. Quem sabe um dia o jabuti cai sozinho, ou ajuda a derrubar a árvore…

Compartilhar:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *