Decisão de Gilmar Mendes paralisa ações e acende alerta sobre futuro da contratação por pessoa jurídica no Brasil

A decisão do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender todas as ações que discutem a legalidade da chamada pejotização no Brasil reacende um debate crucial para o mercado de trabalho. Embora a medida atinja diretamente apenas processos em andamento, ela antecipa uma possível transformação estrutural nas relações trabalhistas no país.

O que está em jogo

O julgamento final do STF, ainda sem data definida, será feito sob o rito da repercussão geral, o que significa que sua decisão valerá como regra para todo o Judiciário. O ponto central é definir se empresas podem contratar profissionais como pessoa jurídica (PJ) mesmo quando a relação apresenta elementos típicos de vínculo empregatício, como subordinação, hierarquia e exclusividade.

Atualmente, milhões de trabalhadores atuam como PJ em áreas como tecnologia, saúde, vendas e comunicação. A prática, conhecida como pejotização, gera economia para as empresas, mas é criticada por precarizar direitos trabalhistas.

Entenda o que é pejotização

A pejotização ocorre quando o trabalhador é contratado como pessoa jurídica, muitas vezes como microempreendedor individual (MEI), para exercer atividades regulares dentro da empresa. Em vez de ter vínculo via CLT, o profissional presta serviços com base no código civil, mantendo, em tese, autonomia contratual.

Segundo os advogados Renato Vieira de Ávila e Alex Ávila, autores do artigo que embasa a discussão, há muita desinformação sobre o tema. “As pessoas confundem a liberdade de escolha da lei — CLT ou código civil — com liberdade de horário ou rotina”, afirmam. O STF entende que obrigações como uso de crachá, uniforme ou horário fixo podem existir, desde que previstas em contrato e que o prestador tenha ciência e aceite.

O que o STF decidiu até agora

A decisão recente não afirma se a pejotização é legal ou ilegal. Gilmar Mendes apenas determinou a suspensão de todos os processos judiciais e administrativos que tratam do tema. A intenção é evitar decisões conflitantes entre a Justiça do Trabalho, a Justiça Federal e os tribunais administrativos como o CARF.

Historicamente, o STF tem se posicionado favoravelmente à validade da contratação por PJ quando o trabalhador é qualificado, informado e aceita o modelo. Já a Justiça do Trabalho mantém entendimento de que, se presentes os cinco elementos clássicos do vínculo empregatício (subordinação, pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e alteridade), a relação deve ser regida pela CLT, independentemente do formato contratado.

Impactos para quem já é ou deseja ser PJ

Com a suspensão, todos os processos que discutem vínculos por pejotização estão paralisados, inclusive novas ações. Isso afeta tanto trabalhadores que pedem reconhecimento de vínculo quanto empresas que discutem obrigações tributárias ligadas ao modelo de contratação.

O que muda para quem é CLT

Caso o STF consolide o entendimento de que a pejotização é legal mesmo em relações típicas de emprego, empresas poderão substituir contratos CLT por acordos com PJs, principalmente em cargos com salários mais altos. Isso pode representar perda de direitos como férias, 13º e FGTS para os trabalhadores, mas maior flexibilidade e economia para as empresas.

Para exemplificar, os especialistas explicam que, em um salário de R$ 15 mil, a empresa pode gastar até R$ 18 mil com encargos na CLT, enquanto o funcionário recebe R$ 11 mil líquidos. Já na contratação via PJ, o mesmo valor pode resultar em R$ 13.500 líquidos ao prestador, com menor custo tributário.

Por que a medida foi tomada agora

O volume crescente de ações trabalhistas no STF e o risco de uma tese contrária à pejotização ser firmada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) ou pelo CARF levaram o Supremo a agir. A suspensão dos processos busca consolidar um entendimento único, evitando que o STF vire uma instância revisora de todas as decisões da Justiça do Trabalho.

O que esperar daqui pra frente

Ainda não há prazo para o julgamento definitivo. A decisão final do STF pode demorar meses ou até anos. E o impacto dependerá de sua aplicação retroativa (afetando contratos passados) ou apenas prospectiva (valendo para o futuro).

Enquanto isso, o mercado segue contratando via PJ, amparado por entendimentos anteriores do próprio Supremo. “A vasta quantidade de julgados disciplina a forma de contratação por PJ aceita pelo STF”, destacam os autores do artigo.

Milhões de profissionais aguardam por uma resposta da mais alta corte do país — uma resposta que pode redefinir o futuro do trabalho no Brasil.

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