Atualização da norma trabalhista transforma riscos emocionais em passivo jurídico — e especialistas alertam que o tempo de adaptação é agora
Desde maio de 2025, empresas de todos os portes precisam considerar a saúde mental dos colaboradores como um item obrigatório de gestão. A mudança ocorre após a atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-01), aprovada em agosto de 2024, que passa a exigir mapeamento e controle dos chamados riscos psicossociais — como estresse, metas abusivas, assédio e burnout.
Segundo especialistas, trata-se de uma virada histórica na legislação trabalhista brasileira, que agora considera o bem-estar emocional como parte integrante da segurança no trabalho.
Riscos invisíveis, prejuízos reais
“É uma virada de chave. Pela primeira vez, a legislação trabalhista brasileira trata a saúde mental como um item obrigatório de gestão de risco. As empresas que não se adequarem à NR-01 podem ser responsabilizadas por omissão — inclusive em ações judiciais”, afirma a advogada Juliane Garcia de Moraes, especialista em saúde no trabalho.
Os dados justificam a urgência. De acordo com o Ministério da Previdência Social, o Brasil registrou 472.328 afastamentos por transtornos mentais em 2024 — alta de 68% em relação ao ano anterior. A ansiedade, sozinha, já afeta mais de 56 milhões de brasileiros.
Nova obrigação empresarial
A NR-01 exige que empresas com funcionários celetistas implementem um Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) e adotem ações específicas de prevenção a riscos psicossociais. As ações podem incluir treinamentos, reorganização de jornadas, canais de escuta e revisão de metas.
“Muitos empresários acham que vão precisar montar grandes estruturas, mas a norma pede um plano viável e contínuo. É mais sobre clima organizacional do que sobre papelada”, explica Patrícia Bastazini, CEO da Bastazini Contabilidade, especializada em pequenas e médias empresas.
Liderança no centro da mudança
Para o consultor Flávio Lettieri, a liderança precisa estar preparada para aplicar a norma com empatia e coerência. “Não adianta ter um documento assinado se o gestor cobra metas inalcançáveis ou ignora pedidos de ajuda. A NR-01 exige mudança de cultura organizacional”, ressalta.
Flávio, que transformou sua vivência pessoal com ansiedade em um projeto de capacitação para líderes, defende treinamentos objetivos e ações práticas como forma de evitar afastamentos, processos e queda de produtividade.
Fiscalização começa em 2026
Embora as autuações formais comecem em maio de 2026, a recomendação é que as empresas se adaptem ainda neste segundo semestre de 2025. Até lá, a fiscalização terá caráter educativo, mas os órgãos já estão realizando inspeções com base nos dados enviados pelo e-Social.
“Não é algo que se resolve com uma palestra motivacional. É preciso mapear os riscos, criar planos viáveis e sustentar uma cultura de cuidado no dia a dia. Essa é a mudança real que a NR-01 está trazendo”, conclui Patrícia Bastazini.

